Notícia
Geral
O arquiteto que seleciona futuros campeões
"Aqui é a terra do cavalo!"
Sob um entardecer ensolarado, típico da primavera na Campanha, o arquiteto de formação e um apaixonado por cavalos, Renato Gameiro, observa dezenas de potros em vários dos tradicionais haras localizados na região que liga Bagé a Aceguá.
Brinca com os equinos e diz que sua paixão por cavalos de corrida vem desde a infância. Há anos, seleciona animais para criadores, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, país onde está radicado há quase três décadas. “Gosto de vir, escolher os animais e acompanhar o desenvolvimento dos cavalos”, explica o proprietário da agência Albatroz, um das mais tradicionais empresas do mercado de cavalos Puro-Sangue Inglês (PSI). As vindas à Rainha da Fronteira são anuais. Gameiro faz sempre a primeira inspeção de potros em outubro, depois retorna em janeiro e, em seguida, em março. Tudo isso para que os animais escolhidos para seus clientes possam ser adquiridos, depois, na fase de leilões, entre os meses de maio e junho. Gameiro chegou sexta-feira à região e vai embora hoje, tendo visitado em torno de seis haras localizados em Bagé e Aceguá, observando um total de até 300 animais.
Além do trabalho como agente, Gameiro tem publicações voltadas ao esporte, escreve no Jornal do Turfe e tem um blog. Em seu currículo, várias descobertas de cavalos de excelência, como o Glória de Campeão, que ganhou a Dubai World Cup, por um proprietário sueco, mas que residia no Brasil. “Ele ganhou só nessa prova um prêmio de 10 milhões de dólares”, recorda. Hoje, Glória de Campeão não corre mais, mas está como reprodutor no Haras Fronteira, em Bagé. Outro destaque é Da Hoss, que venceu por duas vezes a Breeders’ Cup Mile. “Também teve o Hard Buck, cavalo bageense de criação do Haras Old Friends que foi segundo na Dubai World Cup e depois foi correr o tradicional páreo inglês King George IV, em Ascot. Outro cavalo bageense, um verdadeiro fenômeno, foi Einstein, criação do Haras Mondesir, que comprei para um grupo americano e ele foi direto e ganhou prova de três milhões de dólares, ou seja, têm inúmeros casos de sucesso que comprovam que o cavalo brasileiro e o de Bagé têm muita competitividade”, enfatiza.
Produção local
Este carioca diz que sua primeira transação de cavalos foi aos 8 anos, “Morava em Teresópolis (Rio de Janeiro) e troquei uma bicicleta por um cavalo de praça, porém meu pai, quando descobriu, obrigou-me a desfazer o negócio. Foi uma transação que durou apenas 24 horas.” Visitar os haras que estão instalados entre os municípios de Bagé e Aceguá é um momento para conhecer uma produção diferenciada. A chamada “Kentucky brasileira” é, para Gameiro, a número um em criação no Brasil. “Aqui é a terra do cavalo. Existem pontos no Brasil que eu considero como ‘terra de cavalos’. No Paraná, duas regiões que gosto muito são Tijucas do Sul e São José dos Pinhais. No entanto, tudo em Bagé, para o cavalo PSI, é bom. Claro, há áreas para criação melhores do que outras no município, mas aí são outros aspectos. No geral, aqui há condições climáticas muito boas. Há duas únicas coisas que pecam em Bagé. Uma delas é o excesso de qualidade do pasto. Se o criador não tiver controle, o cavalo se torna um elefante. Tem que ter muito cuidado para que o animal não fique pesado, porque ele é um atleta que você está produzindo. Outro fator é que a região tem pouca arborização, o que é uma vantagem no Paraná”, ressalta.
Concorrência
Ele avalia que os haras da região têm 80% do mercado nacional na criação de cavalos PSI. Porém, Gameiro analisa que o país está decaindo em número de produtos. Além da crise econômica, que está desestimulando os negócios, muitas éguas estão indo para o Uruguai, país que apresenta uma melhora no cenário do turfe. Contudo, a grande concorrência na criação brasileira está em países como a Argentina e o Chile. “O Chile melhorou muito porque houve uma conscientização em trabalhar com genética”, afirma o agente que estima que o Brasil produzia, na década de 80, cerca de nove mil cavalos ao ano. Hoje, varia entre 2,7 mil a 2,9 mil. Por sua vez, a região de Bagé e Aceguá abrange uma produção anual de cerca de 1,2 mil potros, conforme o especialista. “Nós, aqui no Brasil, até o final dos anos 90, estávamos bem, importando uma série de 30 a 40 éguas por ano dos EUA, melhorando a nossa genética, mas depois parou. E agora essas éguas não são mais mães, são avós. Então, isso acaba diminuindo a qualidade dos produtos. Aí, de repente, surge um cavalo de exceção. Mas nesse esporte não dá para viver com a exceção, e sim com a regra”, reforça.
Mercado
Gameiro detalha à reportagem que, no passado, já vendeu muitos cavalos brasileiros para grupos americanos, mas, hoje, o cenário está difícil. Isso, graças à competição de países como a Argentina e o Chile no mercado PSI. “O Brasil teve um período muito bom de venda de cavalos, vendemos muito bem para os Estados Unidos, como o Pico Central, entre outros. Mas parou porque não podemos, simplesmente, achar que há um mercado no exterior e que eles virão até aqui. O que dificulta é que temos uma genética inferior. A única vantagem é o preço. Também ainda temos de enfrentar o problema sanitário. A questão de doenças como mormo e piroplasmose impede que possamos exportar cavalos para a Europa e os Estados Unidos, isso faz com que o mercado fique restrito ao Japão e à África do Sul. Porém, aí se enfrenta, também, a concorrência de países como a Austrália”, comenta o representante da Albatroz, que salienta que um dos diferenciais na produção de cavalos PSI está na mão de obra brasileira. “Os profissionais dos haras, veterinários, gerentes, trabalhadores, todos fazem um trabalho excepcional. A mão de obra brasileira é muito boa para cavalos de corrida”, frisa.
Alternativa
Sobre o atual momento do turfe, Gameiro declara que é de crise, porém como a vivida por outros países no passado. “Todo mundo passou por esse processo. Os Estados Unidos teve essa fase há muitos anos. O Japão, na Segunda Guerra Mundial, ficou destruído e, hoje, é a terceira potência do mundo em cavalos de corrida. Em 50 anos eles se recuperaram. O Brasil cria e tem cavalos de corrida há 110 anos e ainda não se achou. Ainda não há uma organização; porém, atualmente, a Associação Brasileira de Criadores e Proprietários de Cavalos de Corrida está levando o esporte a sério, tentando, inclusive, colocar, nos hipódromos, os jogos de máquinas, que foram uma alternativa de sucesso nos hipódromos pequenos dos Estados Unidos”, conta. Ele enfatiza que seria muito importante para o setor a aprovação de projeto que autoriza a instalação e operação de máquinas de jogos nos hipódromos, algo que já ocorre em espaços como o de Palermo (Argentina) e Maroñas (Uruguai). “Isso seria a grande saída para o turfe, mas tem que ser centralizado apenas nos hipódromos, porque o dinheiro da máquina é revertido em prêmios e, se você melhora os prêmios, acaba melhorando o nível do cavalo; melhorando o animal, você fomenta todo o espetáculo e as pessoas acabam vindo ao hipódromo”, pondera Gameiro, que reclama que os governantes ainda não sabem da importância econômica e social do cavalo de corrida. “O governo não sabe o quanto isso estimula em economia e nem a importância para geração de emprego. Cada cavalo, dentro de seu ciclo de vida, envolve cerca de cinco famílias. Do haras até o hipódromo. Se parar o turfe, essas pessoas irão trabalhar onde? Isso não pode acontecer no turfe brasileiro. O governo não deu atenção ao setor, sendo que na verdade, ele emprega muitas pessoas. Criou-se a imagem de que é um esporte de pessoa rica, mas é uma indústria, gera emprego, gera dinheiro” reitera.
Escolha
Para a escolha de futuros campeões, Gameiro tem uma máxima: não é ele que escolhe, é o bom cavalo que faz isso. “Tem que olhar para o cavalo e ver que ele será bom. Não tem uma fórmula mágica. Você só descobre na pista. Desde que comecei a escolher cavalos para meus clientes, comecei a desenvolver um tipo de conhecimento que me dá força para achar que esse cavalo pode ser bom. E quando vários cavalos escolhidos são bons, você cria seu nome”, ressalta o agente que complementa: “O cavalo de corrida, desde que é gerado, já tem um código genético que aponta se ele será um campeão. Você não cria um campeão, você pode perder um campeão. Tem-se que ficar atento a todos os elos dessa cadeia, que, se falharem, poderão colocar tudo a perder”, encerra o arquiteto cuja missão é descobrir novos talentos para o turfe.
Brinca com os equinos e diz que sua paixão por cavalos de corrida vem desde a infância. Há anos, seleciona animais para criadores, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, país onde está radicado há quase três décadas. “Gosto de vir, escolher os animais e acompanhar o desenvolvimento dos cavalos”, explica o proprietário da agência Albatroz, um das mais tradicionais empresas do mercado de cavalos Puro-Sangue Inglês (PSI). As vindas à Rainha da Fronteira são anuais. Gameiro faz sempre a primeira inspeção de potros em outubro, depois retorna em janeiro e, em seguida, em março. Tudo isso para que os animais escolhidos para seus clientes possam ser adquiridos, depois, na fase de leilões, entre os meses de maio e junho. Gameiro chegou sexta-feira à região e vai embora hoje, tendo visitado em torno de seis haras localizados em Bagé e Aceguá, observando um total de até 300 animais.
Além do trabalho como agente, Gameiro tem publicações voltadas ao esporte, escreve no Jornal do Turfe e tem um blog. Em seu currículo, várias descobertas de cavalos de excelência, como o Glória de Campeão, que ganhou a Dubai World Cup, por um proprietário sueco, mas que residia no Brasil. “Ele ganhou só nessa prova um prêmio de 10 milhões de dólares”, recorda. Hoje, Glória de Campeão não corre mais, mas está como reprodutor no Haras Fronteira, em Bagé. Outro destaque é Da Hoss, que venceu por duas vezes a Breeders’ Cup Mile. “Também teve o Hard Buck, cavalo bageense de criação do Haras Old Friends que foi segundo na Dubai World Cup e depois foi correr o tradicional páreo inglês King George IV, em Ascot. Outro cavalo bageense, um verdadeiro fenômeno, foi Einstein, criação do Haras Mondesir, que comprei para um grupo americano e ele foi direto e ganhou prova de três milhões de dólares, ou seja, têm inúmeros casos de sucesso que comprovam que o cavalo brasileiro e o de Bagé têm muita competitividade”, enfatiza.
Produção local
Este carioca diz que sua primeira transação de cavalos foi aos 8 anos, “Morava em Teresópolis (Rio de Janeiro) e troquei uma bicicleta por um cavalo de praça, porém meu pai, quando descobriu, obrigou-me a desfazer o negócio. Foi uma transação que durou apenas 24 horas.” Visitar os haras que estão instalados entre os municípios de Bagé e Aceguá é um momento para conhecer uma produção diferenciada. A chamada “Kentucky brasileira” é, para Gameiro, a número um em criação no Brasil. “Aqui é a terra do cavalo. Existem pontos no Brasil que eu considero como ‘terra de cavalos’. No Paraná, duas regiões que gosto muito são Tijucas do Sul e São José dos Pinhais. No entanto, tudo em Bagé, para o cavalo PSI, é bom. Claro, há áreas para criação melhores do que outras no município, mas aí são outros aspectos. No geral, aqui há condições climáticas muito boas. Há duas únicas coisas que pecam em Bagé. Uma delas é o excesso de qualidade do pasto. Se o criador não tiver controle, o cavalo se torna um elefante. Tem que ter muito cuidado para que o animal não fique pesado, porque ele é um atleta que você está produzindo. Outro fator é que a região tem pouca arborização, o que é uma vantagem no Paraná”, ressalta.
Concorrência
Ele avalia que os haras da região têm 80% do mercado nacional na criação de cavalos PSI. Porém, Gameiro analisa que o país está decaindo em número de produtos. Além da crise econômica, que está desestimulando os negócios, muitas éguas estão indo para o Uruguai, país que apresenta uma melhora no cenário do turfe. Contudo, a grande concorrência na criação brasileira está em países como a Argentina e o Chile. “O Chile melhorou muito porque houve uma conscientização em trabalhar com genética”, afirma o agente que estima que o Brasil produzia, na década de 80, cerca de nove mil cavalos ao ano. Hoje, varia entre 2,7 mil a 2,9 mil. Por sua vez, a região de Bagé e Aceguá abrange uma produção anual de cerca de 1,2 mil potros, conforme o especialista. “Nós, aqui no Brasil, até o final dos anos 90, estávamos bem, importando uma série de 30 a 40 éguas por ano dos EUA, melhorando a nossa genética, mas depois parou. E agora essas éguas não são mais mães, são avós. Então, isso acaba diminuindo a qualidade dos produtos. Aí, de repente, surge um cavalo de exceção. Mas nesse esporte não dá para viver com a exceção, e sim com a regra”, reforça.
Mercado
Gameiro detalha à reportagem que, no passado, já vendeu muitos cavalos brasileiros para grupos americanos, mas, hoje, o cenário está difícil. Isso, graças à competição de países como a Argentina e o Chile no mercado PSI. “O Brasil teve um período muito bom de venda de cavalos, vendemos muito bem para os Estados Unidos, como o Pico Central, entre outros. Mas parou porque não podemos, simplesmente, achar que há um mercado no exterior e que eles virão até aqui. O que dificulta é que temos uma genética inferior. A única vantagem é o preço. Também ainda temos de enfrentar o problema sanitário. A questão de doenças como mormo e piroplasmose impede que possamos exportar cavalos para a Europa e os Estados Unidos, isso faz com que o mercado fique restrito ao Japão e à África do Sul. Porém, aí se enfrenta, também, a concorrência de países como a Austrália”, comenta o representante da Albatroz, que salienta que um dos diferenciais na produção de cavalos PSI está na mão de obra brasileira. “Os profissionais dos haras, veterinários, gerentes, trabalhadores, todos fazem um trabalho excepcional. A mão de obra brasileira é muito boa para cavalos de corrida”, frisa.
Alternativa
Sobre o atual momento do turfe, Gameiro declara que é de crise, porém como a vivida por outros países no passado. “Todo mundo passou por esse processo. Os Estados Unidos teve essa fase há muitos anos. O Japão, na Segunda Guerra Mundial, ficou destruído e, hoje, é a terceira potência do mundo em cavalos de corrida. Em 50 anos eles se recuperaram. O Brasil cria e tem cavalos de corrida há 110 anos e ainda não se achou. Ainda não há uma organização; porém, atualmente, a Associação Brasileira de Criadores e Proprietários de Cavalos de Corrida está levando o esporte a sério, tentando, inclusive, colocar, nos hipódromos, os jogos de máquinas, que foram uma alternativa de sucesso nos hipódromos pequenos dos Estados Unidos”, conta. Ele enfatiza que seria muito importante para o setor a aprovação de projeto que autoriza a instalação e operação de máquinas de jogos nos hipódromos, algo que já ocorre em espaços como o de Palermo (Argentina) e Maroñas (Uruguai). “Isso seria a grande saída para o turfe, mas tem que ser centralizado apenas nos hipódromos, porque o dinheiro da máquina é revertido em prêmios e, se você melhora os prêmios, acaba melhorando o nível do cavalo; melhorando o animal, você fomenta todo o espetáculo e as pessoas acabam vindo ao hipódromo”, pondera Gameiro, que reclama que os governantes ainda não sabem da importância econômica e social do cavalo de corrida. “O governo não sabe o quanto isso estimula em economia e nem a importância para geração de emprego. Cada cavalo, dentro de seu ciclo de vida, envolve cerca de cinco famílias. Do haras até o hipódromo. Se parar o turfe, essas pessoas irão trabalhar onde? Isso não pode acontecer no turfe brasileiro. O governo não deu atenção ao setor, sendo que na verdade, ele emprega muitas pessoas. Criou-se a imagem de que é um esporte de pessoa rica, mas é uma indústria, gera emprego, gera dinheiro” reitera.
Escolha
Para a escolha de futuros campeões, Gameiro tem uma máxima: não é ele que escolhe, é o bom cavalo que faz isso. “Tem que olhar para o cavalo e ver que ele será bom. Não tem uma fórmula mágica. Você só descobre na pista. Desde que comecei a escolher cavalos para meus clientes, comecei a desenvolver um tipo de conhecimento que me dá força para achar que esse cavalo pode ser bom. E quando vários cavalos escolhidos são bons, você cria seu nome”, ressalta o agente que complementa: “O cavalo de corrida, desde que é gerado, já tem um código genético que aponta se ele será um campeão. Você não cria um campeão, você pode perder um campeão. Tem-se que ficar atento a todos os elos dessa cadeia, que, se falharem, poderão colocar tudo a perder”, encerra o arquiteto cuja missão é descobrir novos talentos para o turfe.