Nasci no ano de 1950. Logo era muito pequeno quando Ribot fez das suas. Na verdade nasci para a vida consciente, quando já passava dos 15 e embora o turfe sempre me fascinasse - já que suas carreiras eram "televisadas" na década de 50 - o futebol nem sempre - foi lá pelos 18 anos que posso dizer, que ingressei no turfe, adquirindo com 18 outros amigos, uma migalha de um cavalo. Até ali, desde minha "memorabilidade" a respeito de minha infância, cavalos eram os da Praça do Alto em Teresópolis.
Mas tive o privilégio, de ainda estar vivo, para ver Frankel fazer das dele. Hoje 20 de Outubro de 2012 ele encerrou a sua campanha, invicto e sublime, como nunca deixou de ser. Outubro é o mês de meu nascimento, mas também de grandes despedidas. Secretariat o fez, ganhando sua décima sexta carreira no dia 28 de Outubro de 1973, na grama de Woodbine, montado por Eddie Maple. Mais recentemente Sea the Stars e Zarkava, o fizeram quando da disputa de seus respectivos Arcos.
O filósofo e critico francês Roland Barthes, uma vez se expressou com estóica propriedade, como sempre foi de seu estilo: a diferença entre a língua falada e a língua escrita é a diferença entre a histeria e a paranóia. O escrito é absoluto, o falado pode ser contradito, refraseado.
Frankel é para ser escrito, nunca para ser falado, pois, acredito ser ele o maior depositário de classe há muito aparecido nas pistas. Ele é tão penetrante que pode inclusive contrariar a crença que a unanimidade é burra, cega. Ele é tão coerente em sua lucidez, que é capaz de fazer mesmo seus críticos, calarem-se a cada uma de suas apresentações. Quando escrevi, que ele poderia ser o novo Ribot, de maneira alguma o construí nos moldes de um mito; ele construiu-se dentro de mim, nos recessos de meu subconsciente, utilizando as reminiscências de minha memória. Senti nele, desde seus primórdios de suas investidas oficiais, a mesma consistência heróica dos personagens de Homero. Impávidos. Colossais. Inexpugnáveis. Ourivesaria de feitos surpreendentes, transcendentais.
A contundência de sua superioridade de tão suave cristalização, mansa, quase enternecida, foi para aqueles que pouco conhecem do que pode ser um elemento de exceção, vista como subversiva, anômala. Mas para os acólitos, a forma como ele vinha conquistando seus triunfos, poderia ser fruto da fraca qualidade de seus adversários. Cavalos como Itajara e Emerald Hill, para se citar dois casos de invictos animais brasileiros, vistos pelos ignaros, de maneira semelhante, não ganharam de ninguém. Mas tenho a mais límpida certeza, que se alguém existisse, estes seriam tratados da mesma forma: como "ninguéns".
Creio que Cirrus des Aigles tenha que ser visto como um dos melhores cavalos em treinamento da atualidade em provas acima da milha. Por sua vez, Nathaniel, embora não seja mais o mesmo, diria ainda ser cavalo de muito respeito. E Frankel, os bateu, em pista, que se encontrava num estado, que não era de seu total agrado. Não foi brilhante como de outras vezes. Passou por Cirrus des Aigles, com aquela sua suavidade de sempre. Sem ser necessário esforço qualquer. Porém, não desvincilhou-se como era esperado. Cirrus des Aigles endureceu e não lhe cedeu mais centímetro algum. A distância conquistada, no inicio da reta, não cresceu. Porém, pelo menos, manteve-se e para tal o chicote teve que ser usado.
Frankel largou mal. Posicionou-se por fora e creio que grande parte de sua vitória deva ser atribuída a seu faixa. No inicio, aquele que deveria ditar o ditame da contenda, manteve-se em terceiro atrás de Cirrus des Aigles e Nathaniel. Em dado momento, ainda no desenrolar dos primeiros metros, seu jockey olhou para trás a procura do titular. Não o achou. Frankel foi trazido para a quarta colocação a meio corpo de seu faixa e uma comunicação foi trocada entre os dois jockeys. Imediatamente seu faixa saiu ao encalço do ponteiro e conseguiu um aumento gradual no trem de corrida. Foi providencial. Penso que tenha influído no resultado final da prova.
Uma verdadeira multidão o ovacionou. E nada mais à sua altura, que isto tenha vindo a acontecer em Ascot. O subjetivismo de minha afirmativa, ainda no inicio de sua carreira, hoje pertence a uma realidade objetiva. Querendo meus críticos ou não, foi escrito e faz hoje parte dos anais. Sei que nos cérebros pobres as realidades objetivas morrem. Nos com a ausência de uma massa cefálica, simplesmente inabitam, no máximo se transformando em apercepções medíocres. Outrossim, nas imaginações férteis, elas ganham um amplo sentido, ainda mais alto que as grandezas antes vistas, alongam-se em suas perspectivas e transmudam até, as realidades astrais. E quem não gostar, que tire suas cuecas pela cabeça.
E não é que Shirocco Star foi mais uma vez segunda!