Tudo teve seu inicio na Europa. Falo da formação do cavalo de corrida. Os britânicos trataram de organizar as regras tendo como idéia aquilo que deveria se transformar num esporte e os franceses imediatamente partiram para a criação e até o meio do século passado, competiam de igual ao igual com os habitantes do outro lado do canal.
Pouco a pouco os Estados Unidos foi se organizando e mesmo sofrendo fortes pressões de atos europeus - principalmente por parte de franceses contra seus cavalos e isto fez que por uma breve período muitos deles fossem impossibilitados de serem inscritos no stud book. Juntando-se a este ato covarde, à grande receção de 29 o turfe nos Estados Unidos tinha tudo para ir para o brejo. Mas não foi. Renasceu das cinzas e hoje demonstra uma pujança extraordinária.
As vezes me pergunto, porque não renascemos das cinzas como pais e como turfe?
Conta a história que em 1987 Joaquim Murtinho, então ministro da fazenda do governo Campos Sales atribuiu ao fato dos Estados Unidos estarem se transformando numa grande potência e nós não, a um detalhe de formação: em sua visão era impossível aspirarmos tomar os Estados Unidos como exemplo para nosso desenvolvimento industrial, pelo simples fato de não termos as aptidões superiores de sua raça, força que representa o principal papel no progresso industrial deste pais. A inércia a que estávamos já submetidos já naquela época, segundo este senhor, era decorrente de uma degeneração genética e moral produzida pela miscigenação racial. O que anos depois Nelson Rodrigues classificou como um complexo de vira-latas.
Não vou tentar justificar ou criticar o raciocínio do senhor Murtinho, sei apenas que no turfe sofremos durante anos uma degeneração genética. Não chegamos ao estágio de mazombos, como eram conhecidos os primeiros mestiços depois da chegada dos colonizadores portugueses. Pois no inicio, graças a algumas famílias, importamos matrizes importantes da Europa. Outrossim, a ação de dezenas, ou melhor centenas de eletricistas para aqui trazidos do exterior e prestigiados por nossos criadores, criou um entrave em nosso progresso genético. Regredimos. Houve época que trazíamos ainda inéditos, ou mesmo para correr, cavalos que se colocavam no Derby da Inglaterra.
Abro um parênteses. Vivo fora do Brasil, desde 1987, e posso afiançar a vocês, que da mesma forma que exagerávamos a nos sentir vira-latas por perdermos para o Uruguay uma Copa do Mundo no Maracanã, hoje não somos mais mazombos. Vieram as seleções de 1958 e 1962 e aprendemos, tanto na Suécia como no Chile, que quando unidos na direção certa podemos ter certeza que as coisas irão acontecer. E 1970, foi a maior prova disso. Fecho o parênteses.
Ano, após ano, um cavalo de origem brasileira vem aos Estados Unidos e prova seu valor. Agora são Ivar e Jolie Olimpica. Mas tempos atrás tivemos dezenas de igual valor. Fomos capazes de gerar elementos extraordinários como Riboletta, Leroidesanimaux, Pico Central, Einstein, Siphon, Sandpit, Hard Buck, Reginie, e tantos outros. Só a Argentina foi capaz de gerar outros de mesma capacidade em tal número. Ganhamos uma Dubai Cup com Glória de Campeão. Quantos países do hemisfério sul foram capazes de fazer-lo? Fomos segundo em um King George. Quantos países do hemisfério sul, foram capazes de fazê-lo? E continuamos a não nos dar o mínimo respeito. Continuamos achando que o cheiroso importado sempre cheirará melhor que nosso nacional.
Mas há um túnel, e uma luz ao final do mesmo. Não podemos desistir de ir em frente e encontrar esta luz. Ficar sentado na escuridão não nos auxiliara em nada. Hoje acredito que as gestões de nossos principais hipódromos - talvez pela primeira vez - estejam nas mãos certas. Porque não haver uma união em prol de um bem comum? Algo que tenha um denominador que agrade a todos? Porque não transformarmos, de uma vez por todas, nosso turfe em algo verdadeiramente nacional, como no Uruguay, na Argentina e no Chile? Hoje não seriamos peças regionais desconexas, antagonizando-se cada vez mais?