Já fui jovem, e como tal por algum período foi assolado também, por meus momentos de glamour, nos quais a idéia que toda autoridade, é suspeita, perniciosa, desprezível e se houvesse governo, evidentemente eu seria contra, dominou minha mente. E quando naquela época, estas suspeitas vinham a mente, a reação imediata era de mirar esta autoridade de cima abaixo e, fingir desconhecê-la, certamente negá-la e se possível destruí-la.
A simples acepção da legitimidade que uma autoridade técnica superior deveria exercer sobre si, era imediatamente apagada em sua qualidade e competência. Isto era ser jovem, na minha época. Ser rebelde e desafiar as bases, viessem ser elas quem fossem. Mas como diria Nelson Rodrigues, a juventude é uma doença, que felizmente tem cura. E esta cura se chama amadurecimento.
A gente tem plena certeza que amadureceu, quando para de discutir o sexo dos anjos, pois, chega a simples conclusão que talvez eles nem sequer o tenham, ou até existam… Este, na verdade é, o turning point de sua existência. O passar dos anos, confere a você uma luz de estrondosa vigência e como os franceses você apela, naquele celebre dizer: Tout va bien, maintenant, mas il faut se débrouiller! O que em uma tradução crassa, reflete, agora tudo vai bem, mas a gente precisa se virar!
Eu estava em Paris. O ano era de 1987. E acabara de ver Trempolino ganhar o Arco em 2'26"30, batendo o recorde, que havia sido batido no ano anterior pelo meu idolatrado Dancing Brave, em mais de um segundo e imediatamente fui trazido a uma polemica, que para mim, era uma verdadeira discussão sobre o sexo dos anjos, pois os jubilosos franceses queriam imaginar, dentro de um nacionalismo retrógrado, que o filho de Sharpen Up, era melhor cavalo que o de Lyphard. Que evidentemente na época, embora de propriedade de Prince Khalid, fora taxado, no ano anterior, de “invasor britânico”, quando de sua vitória em Longchamp. O norte-americano Trempolino, ao contrário, defendia as cores, preto e amarelo, em listras horizontais, de Paul de Moussac. Logo, era visto como francês. Puro nacionalismo barato. Puro nonsense.
E Dancing Brave tinha ainda contra si, um defeito que os jornalistas franceses, consideravam ainda mais imperdoável: ele derrotara Bering, que os franceses, em sua esquizofrenia coletiva, pensavam ser o seu novo Sea Bird. Pobres mancebos…
Por que então, isto soava para mim como uma discussão sobre o sexo dos anjos? Afinal, todos tem o direito de achar que A, possa ser melhor do que B. Eu diria que todos tem este direito, como inclusive se jogar do terraço do Empire States e acreditar que tenha uma chance de chegar ao solo, se levantar e bater a poeira. Porém, o simples fato que não haver um termo de comparação, seria como tentar vender a ideia que um KIA era muito superior a uma Ferrari, por que em uma volta de um circuito, ele ter sido mais rápido. Logo, uma discussão sobre o nada.
Desculpem, mas a imprensa francesa é assim. Dona da verdade. E assim se sentem, por que seus ancestrais, em um dia de lucidez, se irritaram com alguém que os mandou trocar o pão por bolinhos, e pescoços rolaram na Bastilha. No outono de 1987, o apix das noticias, era a discussão da validade ou não do uso de véus, entre as estudantes mulçumanas nas escolas publicas francesas, que tinham como lema, o laicismo. Logo…
Da mesma forma que uma grande carreira, não faz um cavalo, negar a superioridade de um, pelo simples fato de se sentir qual um jovem, em uma atividade de adultos, me parece, bisonha. Esta carreira pode no máximo, despertar a atenção para o mesmo. Outrossim, o que realmente o diferenciará dos demais, é a sequência de boas carreiras. Foi assim com Itajara, com Much Better e recentemente com Bal a Bali. Poucos são aqueles que possuem a luz de um Frankel a superioridade de um Flightline, que numa carreira apenas, já desvenda qualquer mistério sobre suas aptidões. E menos ainda aqueles que conseguem senti-la, antes dela se transformar, aos olhos de todos, como um possante farol, há de se haver pudor, pois, o ouvido alheio não é pinico.
O movimento da ação a todo vapor de uma Zarkava, de um Sea the Stars, de um Frankel, de um Itajara, de um Bal a Bali e desculpem a falsa modéstia de um Much Better e de uma Estrela Monarcos, aguça, nos olhos de maior experiência, esperanças de uma liberação de adrenalina, quase irracional. Mas, existem sempre aqueles que afirmam que Emerald Hill, Itajara e mesmo Bal a Bali, nunca foram testados. Que não ganharam de ninguém. Posso até concordar, todavia, levanto a possibilidade - nada remota - que a qualidade destes três citados era tão grande, que qualquer alguém, passa no confronto com eles, a ser visto como mais um ninguém.
Com Duplex aconteceu a "mesmíssima" coisa. Imediatamente os detratores do óbvio, bramiram, deixando escorrer pelas laterais da boca, a baba da inveja, que ele só ganhava fora do Brasil. E mesmo quando ele bateu a argentina Conda naquela milha em Palermo e ao mais forte campo até hoje montado para um Latino Americano em San Isidro, houveram narizes a se manter torcidos.
Vamos abandonar de uma vez por todas estes entreveros inócuos e comparações descabidas. Outro dia me perguntaram se Estrela Monarchos estaria entre os melhores cavalos de corrida que selecionei. Fiquei pasmo, com a pergunta. Não me interessa se Estrela Monarcos, possa ser melhor que Da Hoss, Much Better, Gloria de Campeão, Einstein, Hard Buck, Cara Rafaela, Sea Girl, Indian Hope ou de mais quem quer que seja. O que interessa é que todos eles, - cada um a sua época - cumpriram, com suas obrigações e desempenharam o papel do que deles era esperado. Todos me trouxeram alegria e o senso do dever cumprido. Criar uma escala de importância sobre eles, é infantil. Desculpem, é mais do que isto, é pueril…
Cavalo é individuo. Não deveria ser comparado a outro, a não a ser na disputa de uma corrida comum, em que mesmo assim, qualquer veredicto, terá que ser visto como pontual.
Nosso mercado, o brasileiro, tem que amadurecer. Temos que usar mais a cabeça que o coração. Não podemos ainda pensar qual a escola francesa que nos formou. Temos que ter em mente que cavalos como Bal a Bali e Estrela Monarchos são presentes aos olhos de todos e cabe a nos reverencia-los, nunca compara-los. Pois, o que fica são lembranças e o saldo de tudo é o que você aprende da lição.