Tenho pavor do teórico, seja ele qual for em qualquer atividade proposta. A meu ver no turfe, existem três posições. O teórico que resolve tudo na prancheta. O prático que funciona apenas no instinto, e o prático-teórico, que une a teoria a seu instinto prático. Eu tento ser um prático-teórico. Acho que haverá sempre maior equilibrio nas decisões. Estudo a fundo pedigrees. Assisto ao maior número de carreiras importantes no mundo, mas nunca abandonei a prática de ir lá e tentar achar a pedra preciosa no campo. É na verdade vendo um cavalo, que você verdadeiramente o avalia. Tem uma noção exata se ele é aquilo que seu pedigree dita ser. E quando vem aquela sempre fatidica pergunta por parte de seu cliente. Destes que gostou qual prefere, que você tem que ter certeza absoluta do que está fazendo.
E ai entra aquela velha história: a fome com a vontade de comer. Gosto de ver cavalos. Aprendo com eles, muitas coisas que os livros não contam. E você não avalia um lote em termos de temperamento, expressão e reações, apenas se utilizando de uma fotografia. Foto engana. Dependendo do ângulo, do momento e mesmo da qualidade do fotografo, gato pode parecer lebre. Sei que para muitos, cavalos são todos iguais, afinal, tem apenas uma cabeça, duas orelhas e quatro patas. Lerdo e ledo engano, quem assim pensar. Em cada cavalo existe uma sentença, viva, pulsante. Você tem apenas que descobrir. E existem ainda aqueles que o compram, num amor a primeira vista. Much Better, Gloria de Campeão, Cara Rafaela, Estrela Monarchos e Drollig me compraram. Foi bater os olhos e chegar a conclusão que não poderia viver sem eles.
Para ano que vem espero contar com mais do que um deles. Um já tenho. Um desmamado que comprei na oferta total de plantel do haras Old Friends, para a Black Opal. E dois espero estar a caminho brevemente. Errar, a gente pode sempre errar, aliás o turfe já provou ser um esporte, que vence, quem comete menos erros. Mas os erros sempre virão. Não há como fugir. O que a gente tem que torcer, é para que eles venham espaçadamente. Três em seguida, é mortal. Treinador de futebol, por mais prestigiado que seja, se perde três jogos sequênciais? Rua! Que dirá agente...
Não quero que com estas observações, possa obstaculizar o cumprimento de suas metas. A razão da força sempre prevalecerá sobre a força da razão. Isto não é jogo de palavras e muito menos me foi passado por vó Adelina. Foi a vida que me ensinou, diria até, que a duras penas... Errando e aprendendo com os meus erros.
Pois bem, falemos de forças da natureza. A primeira que imediatamente me vem a cabeça é Danehill. O que faz este sprinter-flyer de discutível qualidade, ser o que é? Ter a rara capacidade, já demonstrada por seu pai, em produzir não só grandes cavalos de corrida, como também a outros capazes de produzir grandes cavalos de corrida. Sejam eles machos ou fêmeas.
Quando você faz de seu conhecimento, sua prática, descobre que existe uma certa similitude nas coisas que acontecem na tribo de Northern Dancer. Não são seus melhores filhos aqueles que levam para frente o nome da tribo. Danzig, nunca foi e nunca será considerado, independentemente de sua invencibilidade, como o melhor filho de Northern Dancer. Mas hoje, é aceito como o melhor de seus filhos no breeding-shed. Danehill, nem de perto estará presente numa lista dos melhores filhos produzidos por Danzig em pista, mas ele é o seu melhor filho na reprodução.
Da mesma forma, Danetime não pode ser visto como o melhor filho de Danehill, nem Bushranger, como o melhor de Danetime, mas algo de especial está acontecendo por esta vereda. Disto não há o menor resquicio de duvida, para quem pesquisa, observa e analisa.
Nestas últimas semanas, Mobsta ganhou o Greenlands Stakes (Gr.2) em Curragh, Ross Castle o Prix Texanita (Gr.3) em Maisons-Laffitte, Now or Never foi terceira nos Irish 1,000 Guineas (Gr.1) depois ter ganho o trial para esta carreira em Leopardstown e Ridge Ranger conquistou o Cecil Frail Stakes, uma listed em Haydock Park. O que eles tem em comum? São filhos de Bushranger. Vamos tentar entender porque.
Em 2013, estrearam os primeiros filhos Bushranger. Ele estava cotado, pois, como corredor havia ganho não só o Prix Morny (Gr.1) em Deauville, como o Middle Park Stakes (Gr.1) em Newmarket. Logo, sua precocidade, velocidade e possível classe era bem vista, dos dois lados do Canal. E por isto teve 145 produtos em sua primeira geração.
Seus filhos venderam bem (average de 35,086 guineas) e eram vistos com bom olhos pelo mercado, que faziam dele o favorito a se tornar o reprodutor de primeira geração com o maior número de individuais ganhadores. Não foi o que aconteceu. Ele obteve apenas cinco ganhadores num total de 47 tentativas. Desastre total. Foi o décimo setimo na estatística prevista pelos experts como possivelmente sua, antes do início da temporada.
Em minha praticidade eu achei normal. Nunca acreditei mesmo e achava que aquela paixão avassaladora do mercado por ele, em nada iria dar. Duas gerações estreadas, uma média de vendas pouco superior a 4,000 Guineas de average, poucos vencedores, nenhuma coisa importante e o caminho passou a ser Turquia! E o tempo passou e incumbiu-se de fazê-lo esquecido.
Lerdo, ledo engano. Os resultados vieram. Ele custou a engrenar, mas parece que agora engrenou e vem em desabalada velocidade para atingir um sucesso, que fará dele, ainda mais valioso aos olhos do mercado, um mercado que nunca gostou de dar o braço a torcer. Mas ele agora está na Turquia. E de lá será dificil de ser tirado. Acreditem.
Como se vê, até o mercado erra.